terça-feira, 25 de agosto de 2009

Os Estatutos do Homem - Thiago de Mello

Conheci Thiago de Mello por meio de um professor muito querido que não vejo há algum tempo. E hoje o dia me lembrou este poema. Sei que ando postando textos longos aqui, mas vale a pena ler até o final... é lindo!

Os Estatutos do Homem (Ato Institucional Permanente)


Artigo I
Fica decretado que agora vale a verdade.
agora vale a vida,
e de mãos dadas,
marcharemos todos pela vida verdadeira.

Artigo II
Fica decretado que todos os dias da semana,
inclusive as terças-feiras mais cinzentas,
têm direito a converter-se em manhãs de domingo.

Artigo III
Fica decretado que, a partir deste instante,
haverá girassóis em todas as janelas,
que os girassóis terão direito
a abrir-se dentro da sombra;
e que as janelas devem permanecer, o dia inteiro,
abertas para o verde onde cresce a esperança.

Artigo IV
Fica decretado que o homem
não precisará nunca mais
duvidar do homem.
Que o homem confiará no homem
como a palmeira confia no vento,
como o vento confia no ar,
como o ar confia no campo azul do céu.

Parágrafo único:
O homem, confiará no homem
como um menino confia em outro menino.

Artigo V
Fica decretado que os homens
estão livres do jugo da mentira.
Nunca mais será preciso usar
a couraça do silêncio
nem a armadura de palavras.
O homem se sentará à mesa
com seu olhar limpo
porque a verdade passará a ser servida
antes da sobremesa.

Artigo VI
Fica estabelecida, durante dez séculos,
a prática sonhada pelo profeta Isaías,
e o lobo e o cordeiro pastarão juntos
e a comida de ambos terá o mesmo gosto de aurora.

Artigo VII
Por decreto irrevogável fica estabelecido
o reinado permanente da justiça e da claridade,
e a alegria será uma bandeira generosa
para sempre desfraldada na alma do povo.

Artigo VIII
Fica decretado que a maior dor
sempre foi e será sempre
não poder dar-se amor a quem se ama
e saber que é a água
que dá à planta o milagre da flor.

Artigo IX
Fica permitido que o pão de cada dia
tenha no homem o sinal de seu suor.
Mas que sobretudo tenha
sempre o quente sabor da ternura.

Artigo X
Fica permitido a qualquer pessoa,
qualquer hora da vida,
uso do traje branco.

Artigo XI
Fica decretado, por definição,
que o homem é um animal que ama
e que por isso é belo,
muito mais belo que a estrela da manhã.

Artigo XII
Decreta-se que nada será obrigado
nem proibido,
tudo será permitido,
inclusive brincar com os rinocerontes
e caminhar pelas tardes
com uma imensa begônia na lapela.

Parágrafo único:
Só uma coisa fica proibida:
amar sem amor.

Artigo XIII
Fica decretado que o dinheiro
não poderá nunca mais comprar
o sol das manhãs vindouras.
Expulso do grande baú do medo,
o dinheiro se transformará em uma espada fraternal
para defender o direito de cantar
e a festa do dia que chegou.

Artigo Final.
Fica proibido o uso da palavra liberdade,
a qual será suprimida dos dicionários
e do pântano enganoso das bocas.
A partir deste instante
a liberdade será algo vivo e transparente
como um fogo ou um rio,
e a sua morada será sempre
o coração do homem.

domingo, 9 de agosto de 2009

Taxista carente

Sexta à noite, ao entrar em um táxi após uma saída não muito feliz, encontro um taxista carente de atenção. Era tudo o que eu precisava para fechar meu dia bem. Entrei no carro, dei o endereço e fiquei calada. Não queria conversar sobre o tempo, trânsito, mercado de transportes e nem gripe suína. Mas eis que o senhor fulano resolve falar...

_ O que que tava acontecendo ai?
_ Um encontro de estudantes de História.
_ Ah, daqueles que quem sabe mais fala mais que os outros?
Pensei. Entendi.

_ Um seminário, congresso...é isso que o senhor quer dizer?
_ Isso, que tem palestras.
_ É isso sim.

E voltei à minha caverna esperando sossego. Mas ele insistiu.

_ Você faz História?

Pensei novamente. Ainda bem que a gente pensa, pensa muito...

_ Não, estudo Comunicação.
_ Comunicação é aquele trem de jornalismo?

Céus...vamos lá para a parte mais difícil....

_ Jornalismo é uma das áreas da comunicação. São basicamente três: Jornalismo, Publicidade e Propaganda e Relações Públicas. Eu faço Relações Públicas.
_ E o que é esse trem de Relações Públicas?

Fiquei apavorada. Tento há quase três anos explicar para meus pais o que faz um relações públicas e eles ainda não entenderam bem. Agora eu teria que explicar em alguns minutos àquela alma falante antes que ela fizesse alguma terrível alusão a minha futura profissão...

_ Nós estudamos gestão de relacionamentos (o que eu estou falando...?). A gente percebe quem são os públicos para uma ação de comunicação e trabalha de maneira específica. Posso trabalhar em empresas, hospitais, escolas, tv...e sempre conto com o trabalho das outras áreas.
_ Ah, entendi.

Duvido, não expliquei nada para ele...

_ E vocês estudam geografia, história..?
_ Sim, basicamente essas duas e português. O curso é da área de humanas.
_ Ah, então é fácil. Num tem física, química, matemática...

Claro que é fácil! Entender as pessoas, dirigir-se a elas é MUITO FÁCIL. Difícil é fazer ponte, porque ela fica dando palpite na estrutura, deturpa o projeto...

_ Eu tô perguntando porque eu separei agora. E quando a gente separa, fica meio deprimido, sabe?
_ Aham, sei...
_ Ai falei com minhas filhas que vou fazer faculdade.
_ Ah sim, muito bom! Faça mesmo, ocupar um pouco a cabeça, começar uma nova atividade...
_ Eu tô muito triste.
_ Olha, não fica assim não. Minha mãe quando separou também ficou triste, todos ficamos. Hoje ela está muito bem, estuda Direito...forma no próximo ano.

Chegamos.

_ Quanto deu?
_ R$ 16, 80.

O telefone toca e logo ele desliga, antes de me dar o troco. Segundo o taxista, o papo - lê-se monólogo - estava bom. E após ficar mais uns cinco minutos aconselhando o pobre homem, passando endereços para que ele conseguisse bolsas de estudo e invocando Deus para abençoar a vida, saí do carro pensando no porquê de eu não ter feito psicologia e ainda não ter entrado para alguma igreja...

domingo, 7 de junho de 2009

Aprendizado

Estou aprendendo a enterrar amigos,
coros conhecidos, e começo as lições
de enterrar alguns tipos de esperança.

Ainda hoje
sepultei um braço e um desejo de vingança.
Ontem, fui mais fundo;
sepultei a tíbia esquerda
e apaguei três nomes da lembrança.

Affonso Romano de Sant'anna

sexta-feira, 29 de maio de 2009

Natural - Volver


Folheando as páginas da Revista Bravo! do mês de março, conheci Volver, banda pernambucana que atua no cenário independente desde 2003, e desde então me encantei com este som! Melodias leves e letras poéticas formam a combinação perfeita para quem gosta de algo novo e de bom tom. "Natural', uma das onze canções do CD "Acima da Chuva" , está entre as minhas preferidas. Aproveitem o som!

terça-feira, 26 de maio de 2009

Presságio

O amor, quando se revela,
Não se sabe revelar.
Sabe bem olhar p'ra ela
Mas não lhe sabe falar.

Quem quer dizer o que sente
Não sabe o que há de dizer.
Fala: parece que mente...
Cala: parece esquecer...

Ah, mas se ela adivinhasse,
Se pudesse ouvir o olhar,
E se um olhar lhe bastasse
P'ra saber que a estão a amar!

Mas quem sente muito, cala;
Quem quer dizer quanto sente
Fica sem alma nem fala,
Fica só, inteiramente!

Mas se isto puder contar-lhe
O que não lhe ouso contar,
Já não terei que falar-lhe
Porque lhe estou a falar...

Fernando Pessoa

quarta-feira, 29 de abril de 2009

Escrevo dentro da noite - J.G. de Araújo Jorge

Quem é este homem que eu ainda não conhecia? José Guilherme de Araújo Jorge (1914-1987), poeta cuja obra lírica, por vezes dramática, exala um romantisno moderno de extremo gosto bom. O "Poeta do Povo e da Mocidade" tem voz de mim. E de você?

Escrevo dentro da noite

Estou escrevendo para não gritar. Para não acordar
os que dormem felizes lado a lado,
os que repousam, aconchegados,
os que se encontram e continuam juntos
e não precisam sonhar
porque não dizem adeus...

Estou escrevendo para não gritar. Para enfunar o coração
[ao largo.
E as palavras escorrem salgadas como um córrego de
[águas mortas
num silencioso pranto.
Tão perto, e nem percebes minha insônia. Nem ouves
[a confidência.
que põe nódoas no papel para não ter que acordar-te
e se transmuda em palavras, que são estátuas de sal.

Estou escrevendo para não gritar. Para não ter tempo
[de acompanhar a noite,
para não perceber que estou só, irremediavelmente só,
e que te trago comigo
sem outra alternativa que o pensamento
- cela em que me debato a olhar a lua entre grades.

Estou escrevendo para não gritar. Para não perturbar
[os que se amam
se juntam, e se estreitam, e sussurram na sombra
e passeiam ao luar,

para que as palavras chovam num dilúvio, silenciosamente,
e me alaguem, e me afoguem, e me deixem pela noite a dentro
como um corpo sem vida e sem alma,
a flutuar...

quinta-feira, 23 de abril de 2009

O sabor de Sophia de M. Breyner Andresen

Terror de te amar num sítio tão frágil como o mundo
Mal de te amar neste lugar de imperfeição
Onde tudo nos quebra e emudece
Onde tudo nos mente e nos separa


Sophia de Mello Breyner Andresen

Poetisa e contista portuguesa, Sophia Andresen inundou minha vida recentemente. E como é evidente a minha paixão pela literatura, resolvi trazer um pouco de sabor para este espaço também.Este poema é só para dar um gostinho, há uma bandeja farta das obras desta escritora pelas livrarias, bibliotecas e pela net. Vale a pena se deliciar!

domingo, 15 de março de 2009

Flashmob T-Mobile

Que eu acho a comunicação um tesão isso é fato há muito! E quando vejo campanhas como estas, fico fascinadamente apaixonada! A operadora de telefonia móvel T-Mobile realizou em Janeiro deste ano um flashmob na estação de metrô londrina de Liverpool. Com o intuito de divulgar sua nova campanha cujo slogan clama pessoas a dividirem coisas inesperadas e maravilhosas com outras pessoas, aproximadamente 350 dançarinos movimentaram a estação ao som de músicas contagiantes! O resultado está neste vídeo que até a presente data foi visto aproximadamente 7 milhões de vezes - belo viral! É realmente contagiante!


Fonte: ADivertido.com

terça-feira, 3 de março de 2009

Digressões de uma sexta à noite

Ah, só o Joel mesmo para divagar comigo em uma sexta à noite...Sentados na mesa de bar, filosofando sobre existência, perda, impossibilidades e afins...saiu esse poema ai... rs...




Escape sonoro de múltiplos entendimentos
Eterna fuga sentimental da perda:
de mim, de meu eu - meu pecado.
Rogo a prece do sabor.
Somos infinitos.
Desbravamos o limite de nós.
Recomeço.

Difere do eu verdadeiro.
Só há a plenitude do fim.
No meu fim de tempo.
Acontece.
Livre.

Depois de rir e chorar, de muitas digressões...pra onde vou?

Joel, como prometido, postado! Que venham outras tantas filosofias e digressões!

sexta-feira, 6 de fevereiro de 2009

As porteiras da educação

Jaz em um descanso intelectual o espaço acadêmico no país. O que buscam as faculdades depois que abriram as porteiras da educação? Como pipocas na panela, estouram aqui e ali diversas escolas que juram ensinar disciplinas acadêmicas. No entanto, o que podemos observar são estruturas e profissionais despreparados para receber alunos e para instigá-los ao exercício do pensamento. E como quem grita "Quatropilhasumreal" vejo sorrateiramente no centro das grandes metrópolis diversas faculdades laçar alunos de outras por descontos de 25% no valor das mensalidades. Ora, pensei que os caça níqueis haviam sido proibidos... agora é só colocar a moeda e se leva o diploma.

A educação virou um leilão contrário: quem dá mais por menos. É como o lance da Sorte do Canal X. Quem acerta o menor valor, leva a renca de pessoas ávidas a uma cela especial na lotação carcerária do país – não vejo outro desejo se não este para alunos de algumas faculdades, já que estas não oferecem qualquer tipo de conhecimento, seja nas áreas a que se propõe um suposto ensino, seja no discorrer de assuntos relevantes à uma boa formação intelectual.

Sinto a boiada que inunda esses falsos centros acadêmicos. Com tal posicionamento, perdemos todos; mercado, por não receber profissionais à altura de suas necessidades; faculdades que realmente realizam bons trabalhos; professores, que ficam desestimulados com os alunos que tem; entre outras tantas questões. Espero que as autoridades que abriram as porteiras, percebam a tempo que o gado está disperso no espaço. E que ele apenas rumina.